Fábio Dias
04/04/2024
Garça 

FecomercioSP pleiteia lei equilibrada para licença-paternidade

De acordo com a Entidade, regulamentação é passo certo, mas pode gerar oneração excessiva para o INSS e para as empresas se mal planejada

Em dezembro de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou um prazo de 18 meses para que o Congresso estabeleça regras específicas ao direito à licença-paternidade. O escopo da lei deve abranger fatores como o tempo de licença e o seu custeio. Atualmente, os pais têm direito a cinco dias corridos de ausência do trabalho, remunerados pelo empregador. 

A Constituição Federal já garante ao trabalhador o direito à licença, “nos termos fixados em lei”. Contudo, a Suprema Corte entende que há omissão do Legislativo quanto à matéria. Em razão disso, diversos Projetos de Lei (PLs) estão sendo propostos, o que exige cautela e discussão aprofundada para que a legislação não crie um benefício que sobrecarregue o orçamento do INSS e onere as empresas, impactando a produtividade. Dentre as propostas legislativas, há textos prevendo aumento em 50% no tempo do benefício ao pai e até mesmo outros que a equiparam ao período da licença-maternidade, de 180 dias. 

A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) dialoga com o Poder Público e analisa as propostas legislativas procurando contribuir para que a regulamentação alcance condições equilibradas. Segundo a Entidade, a possibilidade de ampliação da licença-paternidade para uma participação maior dos pais nos cuidados com a família é questão relevante, merecendo toda a atenção do Congresso para uma solução adequada, sem oneração excessiva ao empresariado — sobre o qual já pesam os encargos que envolvem o trabalho formal.  

Cabe ressaltar que a legislação trabalhista já prioriza a adoção da modalidade home office para pais com filhos de até quatro anos, e que boa parte das empresas adotam teletrabalho, escalas 5×2 e jornada semanal de 40 horas, o que eleva o período disponível para convívio familiar. Além disso, a lei da Empresa Cidadã prevê a prorrogação da licença-paternidade para 20 dias aos empregados das empresas aderentes. 


Custo aos cofres públicos 

O INSS paga o salário de mãe ou pai que esteja usufruindo do direito, mas as empresas continuam contratando substitutos para realizar os trabalhos dos licenciados e obrigadas a quitar os respectivos encargos sociais. No Brasil, esses encargos ultrapassam 100% do salário nominal quando se consideram as contribuições obrigatórias (35%) e a remuneração do tempo não trabalhado (65%) — que inclui férias, décimo terceiro, abono de férias, aviso-prévio etc. 

Dessa forma, é fundamental que se considerem os custos que acompanharão a regulamentação da licença. 


Panorama mundial 


O Brasil está atrasado quanto a uma legislação própria do tema. No mundo, são 114 países que têm a licença-paternidade — e, como consequência, essas nações tiveram redução da mortalidade infantil e aumento do nível de emprego das mulheres, conforme destaca José Pastore, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da FecomercioSP, em artigo ao jornal O Estado de S. Paulo, em dezembro. Ao mesmo tempo, ele apontou que licenças muito longas fazem os pais perderem oportunidades de ascensão na carreira e ainda oneram demais os sistemas previdenciários. 

Entre as nações que concedem o direito, a média de duração é de 9 dias. Os países considerados de “renda baixa” concedem 3 dias, enquanto os de “renda média”, cerca de 6 dias. Já os membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em torno de 20 dias. 

De forma geral, o tempo de licença ao pai é consideravelmente inferior ao da mãe no mundo todo. Nos países mais desenvolvidos, há os que optam pela: 

- concessão de uma licença parental, em que as mães se mantêm afastadas do trabalho por algumas semanas, e os pais em outras; 

- concessão de uma primeira licença ao pai após o nascimento da criança, e de uma segunda quando a mãe retorna ao trabalho.  

Na América Latina, as nações que proporcionam mais tempo de licença-paternidade remunerada são Colômbia, Venezuela e Paraguai (14 dias); enquanto aquelas que dispõe períodos mais exíguos são Chile, México e Brasil (5 dias), além de Bolívia (3 dias), Argentina e Guatemala (apenas 2 dias).

Num momento em que se prossegue para uma regulamentação, o Congresso terá de decidir se a lei aproximará o Brasil dos países mais avançados, com licença mais generosa, ou da maior parte do mundo. “Realisticamente, a decisão terá de ser cautelosa, levando em conta a capacidade de pagamento do INSS e das empresas para não engrossar ainda mais o ‘custo Brasil’”, pontua Pastore, no artigo.

O tema foi debatido na reunião de março do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho, com a presença da deputada federal Tabata Amaral. A discussão se deu em torno de um projeto de autoria da parlamentar. Ela recebeu sugestões de aprimoramento ao texto e os levará ao Grupo de Trabalho (GT) da Câmara dos Deputados que analisa o tema.

 

Regulamentação do benefício não deve prejudicar a produtividade

 

A Federação recebeu a deputada federal Tabata Amaral (PSB/SP), que, ao lado de outros parlamentares, é autora do PL 6.216/2023, que cria e insere essas regras no âmbito da legislação trabalhista e da Previdência Social. A proposta legislativa foi produzida em um Grupo de Trabalho (GT) sobre a licença-paternidade, formado no âmbito da Comissão da Mulher da Câmara e coordenado pela deputada, com participação de especialistas, congressistas e representantes do setor produtivo.  

Agora que a tramitação ganha tração no Congresso, o encontro foi a oportunidade de apresentar à deputada a leitura que os membros do conselho fazem da proposta e sugerir aprimoramentos à redação. “Atualmente, os pais têm direito a cinco dias corridos de ausência do trabalho. Precisamos preencher um buraco que foi deixado desde a Constituinte, que é não termos a licença-paternidade regulamentada. A regra atual estabelece um prazo 24 vezes menor do que a licença-maternidade, e isso mostra o quanto temos uma dívida histórica”, sinalizou a deputada.

 “A regulamentação será importante ao pai e também à mãe. Quando olhamos para a empregabilidade da mulher antes e depois do nascimento do filho, vemos o porcentual cair de 60% para 40%. No caso do homem, mantém-se em 89%. Enquanto o direito ao pai não for uma realidade, a gravidez vai representar um custo de empregabilidade somente para a mulher, o qual precisa ser dividido para que ela tenha mais espaço no mercado de trabalho”, manifestou a parlamentar, durante a reunião. 


Direito mais amplo 

O PL estipula, dentre outros pontos, um aumento gradual da licença-paternidade ao longo de cinco anos, partindo de 30 para 60 dias — metade do que é concedido às mães, atualmente. Isso, segundo Tabata, daria tempo de adaptação às novas regras aos empregadores. Hoje, os cinco dias concedidos aos homens são custeados integralmente pelas empresas. 

“Outra coisa que julgamos importante é ter a Previdência Social arcando com esse custo. Sabemos que há encargos indiretos [aos empregadores] de não dispor desse trabalhador pelos dias da licença. É essencial que isso não seja uma oneração direta ao setor privado. Partindo-se de um escalonamento inicial de 30 dias nos primeiros três anos, estamos falando de um custo anual de R$ 3,8 bilhões, 0,3% dos números da Seguridade Social de 2023”, ponderou Tabata, com base em estudos da assessoria da Câmara dos Deputados. “No fim do prazo de implementação, o custo subiria para R$ 5,8 bilhões anualmente, ou seja, 0,6% do orçamento da Seguridade. Quando se pensa em benefício de uma política pública, esse projeto trará ganhos. Então, vale a pena pagá-lo enquanto sociedade.” 

Custo previdenciário 

Para o presidente do Conselho de Emprego e Relações de Trabalho da FecomercioSP, José Pastore, a licença-paternidade, da forma como está, não auxilia nos cuidados à criança. “Contudo, um prazo longo seria demasiadamente oneroso à Previdência e às empresas, de forma que algo entre os dois extremos terá de ser negociado. Todo direito tem um custo, e precisamos ver sobre quem este recairá, pois está claro que o ‘cobertor’ [previdenciário] é curto. A ideia de progressividade, porém, é muito interessante por dar um tempo de adaptação para a sociedade e ao setor produtivo. E isso está em aberto. Acredito que se possa começar com outro piso e se alcançar outro teto [de dias de afastamento].” 

Segundo José Cechin, ex-ministro da Previdência Social e integrante do conselho da FecomercioSP, o custo sobre a seguridade, ainda que baixo, pode representar uma despesa adicional sobre um sistema que ainda não está completamente equacionado após a Reforma Previdenciária de 2019. “A proposta tem o seu peso, mas não pode ser apenas o impacto financeiro à Previdência o definidor se devemos seguir ou não com isso, mas um balanço de custos ao governo e às empresas, assim como o conjunto de ‘benefícios’ que o PL traz.” 


Custo às empresas 

Ao longo do debate, os membros do conselho reafirmaram que a ampliação da licença-paternidade é defendida, inclusive, nas negociações coletivas do comércio. Uma das ideias sugeridas foi a adoção da licença parental — em que as mães se mantêm afastadas do trabalho por algumas semanas, e os pais em outras. Além disso, a divisão da licença-paternidade em dois períodos: o primeiro após o nascimento da criança, e o segundo quando a mãe retorna ao trabalho. 

Pastore ressaltou que uma das exigências do PL, a de guardar os comprovantes para fiscalização por dez anos, também constituiria uma despesa às empresas, de forma que o ideal seja o prazo prescricional da Consolidação das Leis Trabalhista (CLT), de cinco anos. Além disso, será importante incluir no cálculo os dispêndios com treinamento de novos empregados, bem como o custo total da estabilidade do profissional licenciado, sobretudo se ocorrer a divisão da licença em dois momentos. 

Os conselheiros ainda ponderaram que, de acordo com o PL da deputada, o salário-paternidade corresponderia à remuneração integral. Dessa forma, é importante esclarecer o que compõe essa remuneração e, possivelmente, se adotar as médias utilizadas ao salário-maternidade. A deputada advertiu que é essencial que a lei estipule que essa licença seja obrigatória, de forma a não gerar uma legislação ineficiente em um de seus objetivos: desconcentrar todo o encargo parental sobre a mãe, pois a experiência mostra que quando há licença-paternidade opcional, o titular do direito não escolhe por ela, com receio dos efeitos sobre a carreira. 

Além de acolher as sugestões dos conselheiros, Tabata reforçou que levará algumas das contribuições do conselho ao GT da licença-paternidade para avaliar em quais pontos é possível avançar. (Por FecomercioSP – foto reprodução site https://lillo.com.br/) 


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